Não sou um bom cão.
Com mais frequência do que gostaria, eu mordo.
Rosno e ladro, e depois mordo.
Meu dono antigo era bom em repreender.
Todas as vezes que eu mordia, ele me batia.
Gritava comigo, e dizia que
Não sou um bom cão.
Então acreditei.
Ele devia mesmo estar certo.
Cães bons não mordem.
E eu, mesmo sem malícia, mordia.
Eu era paciente, eu tentava ser bom.
Tentava todos os dias, constantemente.
E eu tentava mostrar isso à ele, lambendo e o acolhendo.
Muitas vezes, tentava mostrar que eu sabia que
Não sou um bom cão.
Mas admitir as próprias falhas é, aparentemente, me fazer de coitado.
E eu não sou um coitado.
Porque mordo.
E não importam meus esforços, não importa o quanto eu censure meus rosnados.
Sempre vou ser o cão que morde.
E serei lembrado
Constantemente
Diariamente
De que mordo.
E de todas as outras vezes que mordi.
Eu não mereço carinho atrás da orelha,
Nem coçada na barriga,
Não mereço qualquer tipo de amor,
Porque mordo.
Mesmo sem querer.
Mesmo que eu não seja mau.
Eu ainda mordo.
E isso é o suficiente.
Mas quando você me adotou
E eu mordi,
Você me disse que lhe machuquei
Mas você me perdoou.
Maus cães não merecem perdão.
Eu certamente não merecia.
Aprendi, durante a vida toda,
Que mordidas não têm perdão
E que eu sempre seria lembrado
E castigado por elas.
Mas você me perdoou.
Me disse que eu era apenas um cão,
E que cães mordiam às vezes.
Não entendi.
Me disseram que nenhum cão morde assim,
Com essa frequência.
Mas você sabia que não era de propósito.
Quando eu lambia para me desculpar,
Você aceitava.
Coçava minha barriga e acariciava atrás da minha orelha.
Mesmo quando lhe avisei que
Não sou um bom cão,
Você disse que isso não era verdade.
Que eu estava tentando,
E que me amava, mesmo mordendo.
Mas me angustiava.
Sempre que eu mordia, esperava que você me batesse.
Esperava que me odiasse.
Que me lembrasse, pelo resto da semana, de como te mordi.
Eu queria que me batesse.
Queria que me castigasse.
E quando nada acontecia, e vinha o perdão,
Então eu mesmo deveria me castigar.
Passei a me morder, a me esfomear.
Jamais, jamais me perdoar.
Como posso fazer isso?
Como posso morder alguém que amo?
Mas para você,
Morder a mim
Doía mais
Do que morder em você.
E então eu entendi o que era amor.
Ser perdoado, mesmo quando mordo.
Porque todo cão morde às vezes.
E afinal, eu era apenas isso:
Um cão.
Comments